domingo, 9 de janeiro de 2011

Ambient 1: Music For Airports






Sempre gostei de música ambiente, um gosto que remonta a minha infância, eu estudava semi-interno no Colégio de São Bento, lá no centro de São Paulo e saindo da escola eu ia para a rua XV de Novembro onde ficava o escritório do meu pai, esperar o dia dele terminar para irmos juntos para casa. O escritório era de uma importante corretora da Bolsa de Valores e tudo era muito chique por ali, móveis bacanas, quadros caros nas paredes e um sistema de som interno que tocava música até nos elevadores. O som era tipo jazz ou música brasileira instrumental, tocada de forma calma e descontraída, mais tarde isso passaria a se chamar de Smooth Jazz ou coisa assim, mas na época, diziam que o nome daquilo era Muzak, no popular: música de elevador, por referir-se a um estilo com arranjos instrumentais bem suaves, destinados para tocar em escritórios, lojas de departamento, aeroportos, salas de espera e, obviamente, elevadores e afins. Algumas legais e outras eram, realmente, o que os ingleses costumam chamar de “pain in the ass”, em português seria “um pé no saco”, mas prefiro usar o termo britânico, porque, a meu ver, uma dor no cu incomoda muuuito mais que um pé no saco, é claro que há controvérsias, mas não vamos entrar nessa ceara! Na verdade, não era um som envolvente, somente algo para servir de pano de fundo ao invés do silêncio. Mas isso mudaria a partir do final dos anos 70, quando um maluco genial chamado Brian Eno desenvolveu um projeto experimental voltado para a música ambiental, convenientemente chamado de Ambient. O primeiro dele foi justamente Ambient 1: Music for Airports (1978), seguido por Ambient 2: Plateaux of Mirror (com Harold Budd - 1980); Ambient 3: Day of Radiance (com Laraaji - 1980); Ambient 4: On Land (1982). Creio que, a partir de então, ficou estipulando o nome Ambient para esse tipo de música, embora o próprio Eno já tivesse feito um trabalho neste estilo anteriormente chamado Discreet Music, em 1975. Então, deduzimos que Ambient é a evolução do Muzak, no entanto, contudo e porém, a origem de tudo é bem mais antiga do que isso. Não sou nenhum doutor, professor ou expert da história da música, mas a coisa mais ancestral que ouvi, similar a isso, está na obra de Frédéric Chopin (1810-1849), seus 12 noturnos para piano. Que, por sua vez, devem ter influenciado o grande Erik Satie (1866-1925) na criação de “Gymnopédies” e “Gnossiennes”, duas obras primas da música universal, que arrisco chamar de raízes da Ambient Music. Daí, até chegarmos a Eno, passamos por John Cage (não confundir com John Cale do Velvet Underground), Karlheinz Stockhausen, György Ligeti, John Chowning, o trio Cluster (Hans-Joachim Roedelius, Dieter Moebius a Conny Plank) e outros que me fogem a memória, mas creio que esses são os principais nomes envolvidos no processo de criação deste modo musical. Esses caras, embora de bagagem erudita, foram pioneiros da música eletrônica e tiveram forte influência em Brian Eno, que, para quem ainda não se tocou, ou não sabe, é aquele mesmo Brian Eno do Roxy Music, produtor do Talking Heads, David Bowie, U2 e um dos profissionais mais respeitados e solicitado da atualidade.









Atmosphères de György Ligeti, serviu de trilha para o filme "2001: Uma Odisseia no Espaço", de Stanley Kubrick, e de inspiração para Brian Eno no desenvolvimento do seu trabalho de música ambiental



O uso da eletrônica foi importante na evolução da Música Ambiental, ao ampliar o espaço sonoro para além dos atributos musicais clássicos (ritmo, melodia e harmonia), destacando o timbre, sobre o qual poderia atuar de forma mais abrangente, graças à possibilidade de multiplicar os sons produzidos pelos instrumentos tradicionais. Por outro lado, esse recurso também foi meio responsável pela banalização da coisa. Praticamente ao mesmo tempo em que surgiu o termo Ambient Music, apareceu o rótulo New Age. O que distingue uma coisa da outra? Eu não saberia dizer ao certo, pois muitas vezes um artista de Ambient é caracterizado como New Age e vice-versa. Mas tenho uma forte teoria: o brega. New Age parece estar ligado mais à meditação, mantras, fadas, cristais e ao mundo espiritual. E muitas vezes, graças aos recursos eletrônicos, a gente chega a duvidar da capacidade musical do intérprete, que parece estar mais apertando botões do que tocando música. Sem falar no ambíguo gosto das capas dos álbuns que, de maneira geral, são sempre as mesmas (cosmos, paisagens surreais, gnomos...) onde só mudam o título. Eu diria que New Age é uma forma comercial de Ambient Music. Pois venhamos e convenhamos que este não é um tipo de música fácil de se vender. Aí, muita gente tende para o lado de fadas, cristais, mantras e naturebas, como apelo comercial, acabam banalizado a coisa e abrindo brechas para um monte de charlatões, ofuscando, pelo preconceito, trabalhos sérios como Ambient 1: Music for Airports, praticamente todo construído com recursos eletrônicos.







Felizmente há quem saiba separar o joio do trigo, o grupo Bang On A Can é um desses. De fato, é muito mais que um grupo, trata-se de uma organização multi-facetada de música clássica, baseada em Nova York. Foi fundada em 1987 por três compositores americanos que continuam como seus diretores artísticos: Julia Wolfe, David Lang e Michael Gordon. É uma força importante na apresentação da nova música de concerto, e apresentou centenas de eventos musicais em todo o mundo. Reconhecendo o valor da Ambient Music, eles resolveram fazer uma homenagem a Brian Eno, em celebração ao vigésimo aniversário de Ambient 1: Music for Airports, recriando a obra e tomando o cuidado para reproduzir os originais de Eno exatamente como são, de forma que cada peça está, precisamente, do mesmo tamanho que a original. Para dar mais peso a este tributo, saíram numa turnê mundial que encantou auditivamente fãs e artistas da música ambiental em todo planeta.

A matéria publicada por André Gomes, no Bodyspace.net, em fevereiro de 2007, por ocasião da apresentação do Bang On A Can, no Porto, em Portugal, ilustra muito bem o efeito causado pela execução da obra.


Quando em 1978 publicou Ambient 1 – Music for Airports, Brian Eno afirmou no booklet do disco que a música ambiental deveria ser capaz de acomodar muitos níveis de atenção auditiva sem forçar nenhum em particular. Disse também que a música ambiental deve ser tão ignorável quanto interessante. De facto, Ambient 1 – Music for Airports, que chegou a ser apresentado como instalação no Marine Air Terminal do aeroporto de LaGuardia, em Nova Iorque, cumpre todos esses requisitos; é cativante mas não aprisiona; é ao mesmo tempo um disco desafiante e de fácil e rápida fruição; belo e inserido numa realidade concreta, num ambiente especifico.

Movido pela admiração ao trabalho de Brian Eno, há alguns anos atrás, o grupo nova-iorquino, Bang on a Can, ligado por cordão umbilical a um festival com o mesmo nome, tratou de transpor Ambient 1 – Music for Airports para ser tocado ao vivo por uma orquestra. O resultado foi uma digressão e um disco lançado em 1997 pela Point Music. O trabalho dos nova-iorquinos levou a o próprio Brian Eno a afirmar que Ambient 1 – Music for Airports tinha crescido e se tornado num ser completo – apesar das vozes que acham que a intervenção do Bang on a Can vai contra a própria idéia da música ambiental.

A apresentação de Ambient 1 – Music for Airports ... ...começou por volta das 23:00 com a execuçãor “1/1”, tema composto por Brian Eno, por Robert Wyatt e Rhett Davies. Na peça dominam os sons do piano (que se repetem) e toda uma ambiência que é criada respeitando sempre o silêncio e as pausas. A interpretação dos Bang on a Can mostrou-se desde logo respeitosa e sublime. Os seis músicos em palco tinham a matéria bem estudada – não é à toa que o San Francisco Chronicle lhes chamou “o veículo de música contemporânea mais importante do país”... ...A representação dos Bang on a Can da obra fundamental de Brian Eno nunca se limitou a imitações; antes, partiu dela para, como disse e reconheceu Brian Eno, lhe dar uma outra vida, uma outra dimensão, distinta mas não necessariamente contraditória. Mais do que no bis (que não impressionou especialmente), a primeira parte de interpretação de Ambient 1 – Music for Airports teve momentos verdadeiramente sublimes.
Por André Gomes, no Bodyspace.net




Está aí, meus caros, tudo que podia ser dito sobre a obra, seu estilo e sua criação, agora ouçam as duas interpretações e confirmem que a música, diz muito mais por si só, do que mil palavras. Agora, apertem os cintos e boa viagem!






Ambient 1, Music For Airports


Bang On A Can - Brian Eno's Music For Airports [2009]
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When the innovative classical ensemble Bang on a Can All-Stars released its version of Ambient music forefather Brian Eno's seminal Music for Airports (Virgin/Astralwerks, 1978) on POINT Music in 1998, it demonstrated how a composition seemingly far removed from the classical sphere could be absorbed into the legitimate canon. And although the studio version is already ten years old, the suite has remained an active part of the group's repertoire, performed as recently as last year at the Bang on a Can Marathon in New York City. With Music for Airports (Live) this unconventional chamber group has delivered a concert rendition of Eno's masterwork to pair with their studio performance; in doing so, clarinetist Evan Ziporyn and BoaC artistic directors Michael Gordon, David Lang and Julia Wolfe have turned Eno's premeditated artistry into something more interpretive and interactive, albeit in decidedly subtle ways. That Eno created much of this experimental music with loops of varying lengths—the end result being a happy blend of coincidence and confluence—make BoaC's live arrangements all the more intriguing.

Eno's original intent with Music for Airports—and subsequent ambient recordings—was to create music of an almost subliminal nature. It offered listeners a relaxing sonic backdrop, a serene alternative to the stimulating music often played in airports, where stress levels already run high and stimulation is the last thing people need. It was music to be felt, more than heard.

While it's easy to lay back and get lost in BoaC's live performance of the piece's four sections, the group has made the listening experience more actively engaging, especially on Ziporyn's arrangement of "2/2," where there's an improvisational component and a gradual, dramatic build-up that's in understated contrast to Eno's less invasive original. Gordon's painstaking arrangement of the suite's most well-known section, "1/1," combines the ensemble's unorthodox instrumentation—cello, clarinet, guitar, percussion, piano/keyboards and bass—with sampled voices, creating a more expansive (but equally calming) soundscape.

Sampled voices also drive "1/2," but Lang's arrangement introduces the other instruments so gradually that its unhurried unfolding and slowly shifting textures offer surprises without losing the piece's inherently tranquil stasis. Wolfe's reworking of "2/1" make guitar and a variety of chime-like sounds behave in an almost call-and-response fashion.

The differences between BoaC's studio version and this live recording are certainly unobtrusive. With the exception of the improvisatory "2/2," it's more about nuance and delicate interpretation of phrase than vivid, definitive re-creation. But if the studio album proved that Eno's ambient music can could be scored as contemporary chamber music, then Music for Airports (Live) reveals it to be no different than any classical piece that receives multiple readings. The differences in interpretation across the versions may be rarified, but they're genuine differences nonetheless, and make Music for Airports (Live) a worthwhile adjunct to Bang on a Can's fine studio recording.
By John Kelman (All About Jazz - published: February 10, 2008)


Brian Eno - Ambient 1: Music For Airports [1978]
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Uma amostragem da maravilhosa Gymnopédie No. 1 de Erik Satie, precursor da Ambient Music e um dos compositores mais influentes da música de vanguarda.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Jeff Babko - Mondo Trio [2007]





Atendendo a minha súplica no post anterior, o blog Only Good Song gentilmente enviou um link para o mais recente trabalho de Jeff Babko, lançado em maio de 2007. Talvez, por gravar tão poucos discos e espaçados por um longo período, um disco de Babko nunca soa parecido com o outro, como se o artista quisesse sempre mostrar um lado diferente da sua faceta musical a cada trabalho. Em Mondo Trio, tudo está muito mais solto e experimental do que em Broject, em alguns momentos chega até a me lembrar um pouco do rock progressivo do Emerson Lake & Palmer. A resenha de Milkowski Bill que encontrei no site da gravadora AbstractLogix ilustra bem a situação:

Mondo Trio é essencialmente, um veículo experimental que permite a Jeff Babko mergulhar em alguns dos aspectos mais subversivos da sua musicalidade multifacetada, este trio renegado é também uma boa vitrine para o baterista Vinnie Colaiuta, que, como numa vingança, está totalmente solto sobre as nove faixas, e, ao mesmo tempo, uma audaciosa aventura para o saxofonista Jeff Coffin, do Bela Fleck and the Flecktones. Juntas, essas três forças musicais altamente criativas, conduzem um pacote musical de fusion, funk e jazz organ trio como num processo de purificação, obtendo resultados cintilantes.



"Esta banda representa uma libertação para mim ", diz o tecladista talentoso que aprendeu a tocar com formação clássica aos cinco anos de idade, para mais se formar em jazz pela Universidade de Miami. "É muito diferente para nós. Não temos a oportunidade tocar esse tipo de música em nossos contidianos profissionais, mas realmente nos divertimos fazendo isso. "



O som da bateria de Vinnie está muito presente na mistura musical ao longo do Mondo Trio, aterrando a sessão com uma autoridade retumbante. Como Babko explica: "Isso é coisa do engenheiro Niko Bolas. Ele trabalha gravando, principalmente, artistas de rock como Neil Young e Keith Richards. Ao ponto de poder ser considerado um produtor de rock, Niko conhece muito bem o Vinnie e tem trabalhado com ele há anos. Então eu sabia que obteria um bom som da sua bateria neste projeto. Antes de começarmos, dissemos a ele: Nós não queremos que isso seja uma gravação segura. Não queremos uma viajem muito jazzística, conduzida ao som do prato. Vamos deixar que seja bruto e capturar a energia ao vivo da sessão. E eu sabia que, dada a atitude de Niko e de onde ele vem sonoramente, que seria capaz de conseguir isso. Um monte de gente pode querer ter a bateria desempenhando um papel mais de apoio, mas aqui são realmente três vozes iguais. "

Essas três vozes, combinam uma explosão retumbante de energia cinética, causada por músicos inspirados dentro de uma volátil jam orientada a La Mondo Trio.
Por Milkowski Bill, do AbstractLogix





Jeff Babko - Mondo Trio

Essentially an experimental vehicle allowing Jeff Babko to delve into some of the more subversive aspects of his multi-faceted musicality, this renegade trio offering is also a brilliant showcase for all-world drummer Vinnie Colaiuta, who is turned loose on these nine tracks with a vengeance, and also for the audaciously adventurous saxophonist Jeff Coffin [Bela Fleck and the Flecktones]. Together these three highly creative musical forces push the envelope on funk, fusion and organ trio jazz originals with some cathartic, scintillating results.




This band represents a release for me," says gifted keyboardist who began classical training at age five and later studied jazz at the University of Miami. "It's so different for us. We don't get a chance to play this kind of music in each of our commercial situations but we really had fun doing it."

The sound of Vinnie's drums is very present in the mix throughout Mondo Trio, grounding the session with resounding authority. As Babko explains, "That comes from the engineer, Niko Bolas. He works on mostly rock records by people like Neil Young and Keith Richards. He would be considered a rock producer but he knows Vinnie real well and has worked with Vinnie for years. And so I knew he would get a great sound on his drums for this project. Initially we told him, 'We don't want this to be a safe recording. We don't want a pretty sounding jazz ride cymbal sound. Let's get it to be raw and let's capture the live energy of the session.' And I knew that given Niko's attitude and where he comes from sonically, he would be able to get that. And a lot of guys might want to have the drums play a more supportive role, but here it's really three equal voices."

Those three voices combine for one resounding burst of kinetic energy and inspired playing on the volatile jam-oriented Mondo Trio

By Milkowski Bill, from AbstractLogix




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